quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

03 - Sonho, Bia, e antes que inferno desabe sobre nós.

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No sofá, deitado com a roupa do corpo, com um lençol que pouco impedia o frio, confrontava a insônia, querendo dormir para deixar o estado sonâmbulo. Remechia-se, suava. Delirava. Falava coisas com coisas. Chorava. Por vezes gritava, sem emitir palavra alguma, um grito do instinto. O inferno era a sua própria mente, que por muito ambicionava. Uma mente extremamente imaginária, capaz de levar ao sonho, mesmo estando acordado. Queria ser um idolo. Queria ser Deus. Nesse estado enlouquente, queria ser tudo, se pelo menos o tudo fosse grandioso. Queria além de suas capacidades, mas acreditava que apenas ainda não havia encontrado um meio, para que com as suas capacidades, pudesse ser tudo.
Em seus devaneios, via no vento o que melhor poderia caracterizá-lo. A liberdade do vento era o verdadeiro sentido de ser livre, livre na sua suavidade, ou em sua fúria, nunca preso, estando em todos os lugares. Podendo ser belo e terrivel ao mesmo tempo.
Não, não pensava como uma pessoa comum.
Estava em um campo. Muitas flores, um horizonte floral, e alguns caminhos transpassavam diante da beleza natural. Thom corria, embriagado pelo aroma. Sentia-se a pessoa mais feliz do mundo. Ou talvez a mais poderosa. Correu pelos caminhos, até chegar em um rio dourado. Passáros enormes, de plumas coloridas como o arco-iris, dançavam no céu como em uma valsa. Ele despiu-se, mergulhou no rio de ouro. Mergulhou fundo, cada vez mais, parecia já ter ultrapassado centenas de metros a baixo da surpeficie. A água dourada era doce como cereja. Podia falar lá embaixo, para ele tudo era possivel, bastava querer. Continuou a descer, e quanto mais fundo, mais sentia-se bem. Aos poucos foi percebendo que existia uma imagem incomum, que cada vez ficava mais nitida, mais próxima. Era algo em forma de gente. Movido pela curiosidade, queria saber quem atrapalhava todo o seu paraiso, era capaz de matar, a curiosidade passou a ser raiva, depois desespero, melancolia. Ao se aproximar do alguém, uma tristeza o sufocava, não podia mais fazer tudo, passou a afogar-se. Mechia os braços, tentava voltar para a superficie, mas estava longe demais. Avistou o rosto, era uma mulher, olhos negros. Aqueles olhos eram nostalgicos, estava perante uma lembrança recente, não conseguia distinguir, reconhecer, nem podia, perdia a consciencia. O pulmão gritou de dor. A moça riu.

Acordou.

_ Enfim, acordou, já passam das 10 da manhã, então é isso, abandona a faculdade para poder ter uma vida de preguiçoso. - Disse uma voz feminina.

Ele olhou para a mulher, tomou um susto, sua mãe estava ali, vermelha de raiva. Sentada em um banco, próxima a porta de entrada do apartamento.

_ Oi mãe. Tudo bem? - Levantou-se, e com espanto, percebeu o quanto o sofá estava suado. Sua cabeça doia bastante. - Ah, mãe, não é nada disso. Larguei a faculdade justamente por não estar bem, coisas estranhas andam acontecendo comigo.

_ Parece que não te conheço, sempre com frescuras, sempre fazendo tempestade em copos d'água. E porque não trancou a porta? Poderia ser um ladrão aqui, em vez de mim. Ah meu Deus, nunca tomas jeito! _ Ela também se levantou, e foi em direção a cozinha, do qual a entrada ficava na própria sala, do lado esquerdo. Thom respirava fundo, tentava diminuir a ansiedade, e principalmente, lembrar o que sonhara, ou se ao menos, tinha sonhado algo. A mãe, de nome Fernanda, voltou com um copo de chá. _ Tome este chá filho, é bom para se acalmar. Sua prima que preparou.

_ Bia está aqui? - Disse ele, sorrindo _ Bia?! - E tomou o chá em um único gole.

Bia entrou, era uma garota de cor escura, diferente de Fernada e seu filho, que são morenos bem claros. Ela sorria, tinha modos suaves, andava com delicadeza, sorria com delicadeza. Era de extratura pequena, seus familiares não eram altos, mas mesmo assim, percebia o contraste. Sentou no banco onde Fernada estivera.

_ Oi Thom, então, como você está?
_ Com algumas dores de cabeça, mas logo deverá passar. Nossa, você cresceu nesses ultimos meses, e como sempre, linda.

Ela corou, ficava sem graça com facilidade. Depois, ficou séria, e analisava minuciosamente o seu primo.

_ Então, porque abandonou a faculdade?
_ Ele é assim mesmo Bia, um acomodado! Tem preguiça, e sempre encontra um motivo para isso!
_ Ah, me deixe mãe, eu não sou mais a sua criancinha, para você dar sermões, e ainda mais esses sermões, vindo de uma mente tão fechada como a sua! _ Fernanda zangou-se, ousou abrir a boca, mais se calou. Preferiu sair da sala, dizendo que ia para o banheiro, mas com a intensão de deixar os primos a sós. Aqueles dois se davam muito bem, como irmãos.

Thom sentou no sofá, Bia saiu da cadeira e fez o mesmo, os dois ficaram lado a lado, olhando um para o outro.

_ Sabe, aquelas minhas paranóias?
_ Sei sim.
_ Então, acho que estou enlouquecendo...
_ Não! Não! Não estás, esquece essa idéias, deve ser uma outra coisa.
_ Sim, é outra coisa, mas essa outra coisa está me enlouquecendo. Eu, eu me sinto preso. Vigiado.. - Ele se calou por alguns segundos, respirando fortemente - Quero mudar toda a minha vida, tudo mesmo. - Olhou para o fundo dos olhos de Beatriz, percebeu neles aquilo que sempre o cativou nela: Entrega. Ela estava pronta para qualquer coisa por ele.
_ Thom! Você me preocupa! Vamos, largue desses pensamentos, a sua vida é essa. E não tem nada de incomum à vida de outras pessoas, nada de errado.
_ É exatamente isso! - levantou a voz, para o espanto de Beatriz. - Eu cansei dessa normalidade, monotomia, estou começando a ter raiva, de tudo e todos, e medo também, não entendo o porque do medo, antes de ontem, não consegui sair daqui, com medo dos meus vizinhos, você precisava está aqui! - Ofegava, falava gesticulando com as mãos, agonia pura.
_ Deve ser que você não está acostumado com o clima daqui, pode ser uma coisa simples assim, pare de exagerar, isso é o que te faz adoecer! -
_ Não é, o ponto capital eu já conheço! Foi anos e anos, com aqueles pensamentos... e por fim, parar aqui, nessa vida comum. Não Bia, não percebe que a vida não pode ser tão simples assim? É preciso magia! Eu quero mudar tudo... e.. e pouco me importa o que as pessoas irão pensar! Quero acordar desse sono, antes que todo o inferno desabe sobre nós...
_ Falas coisa com coisa, parece mesmo um birulo! E que nós, está falando de quem?
_ De ninguém, ninguém não - Falou de modo tão sussurro, que custou a Bia escutar. Apoiou os cotovelos nas cochas, e com as mãos esfregava o rosto. Estava tomado por ansiedade, não somente hoje, mas há vários dias. Chorou. Bia o abraçou. Chorava também com a dor do primo. Os dois ficaram ali, por longos minutos, em um silêncio onde só apenas as suas almas conversavam. Numa ligação tão forte, que se existisse apenas os dois no mundo, ainda assim, poderiam ser felizes.

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